Quando chove eu lembro de Just between lovers. Não tem chovido, mas tem doído, tem sido letárgico e pesado, então, eu lembrei também.
Just between lovers foi um drama exibido pela JTBC entre o fim de 2017 e começo de 2018, que eu só assisti alguns meses depois, mas nunca mais saiu do meu coração. Se passa no inverno, tudo é frio e sem muita cor, tudo cinza, assim como a vida de MoonSoo e GangDoo, os protagonistas.
Os dois, agora por volta dos 30 anos, são sobreviventes de um mesmo desastre em que um shopping desabou em 2005. Eles viveram, mas a irmã mais nova de MoonSoo e o pai de GangDoo não, e muitas outras pessoas também. Desde então, suas vidas nunca mais foram as mesmas e eles carregam consigo feridas que não parecem que fecharão nunca, nem parar de doer.
Suas vidas se entrelaçam novamente quando os dois passam a trabalhar na reconstrução do shopping que caiu. Sim, o mesmo shopping, no mesmo lugar.
Quando eu assisti esse drama pela primeira vez ficava o tempo todo pensando em como eles só podiam ser loucos e gostarem de se torturar por voltar ao lugar onde suas vidas ruíram e para ajudar a erguer aquilo de novo, ainda por cima. Meus questionamentos ficaram ainda piores quando eles ficaram encarregados de visitar as famílias de cada um dos falecidos pedindo autorização para a construção de um memorial para as vítimas no novo shopping.
Eles só podiam estar querendo de torturar de alguma forma.
E isso era verdade. GangDoo e MoonSoo, por motivos e experiências diferentes, carregavam consigo uma enorme culpa por terem sobrevivido. Suas vidas eram como um fardo que eles nunca poderiam deixar de carregar, nem ter ele aliviado, pois deviam viver por aqueles que não puderam sobreviver.
Não era permitido a eles serem felizes, viverem bem, sentirem conforto, paz, descanso. A lembrança das pessoas que morreram os assombrava dia e noite, nunca deixando que experimentassem o gosto da gratidão por estarem vivos, o sabor dessa dádiva, desse milagre. De se enxergarem como milagres.
Porém, foi só recentemente que percebi que entre tudo isso, dentro de MoonSoo e GangDoo existia o imenso desejo de redenção, de completar a sua jornada, sentirem que fizeram algo pelos falecidos, que foram perdoados e libertos.
Mesclado nas suas existências conformadas com o peso da vida, existiam duas almas que gritavam pelo direito de serem felizes e leves.
Foi assim que Just between lovers se transformou aos meus olhos, como uma borboleta saindo do casulo, e brilhou à luz.
Sim, era loucura o que eles estavam fazendo. Mas não consigo imaginar quanta coragem foi necessária que eles tivessem para simplesmente colocar os pés naquele lugar, imagine ir tão longe. Como deve ter doído relembrar aquilo dia após dia, ouvir as pessoas falando sobre o assunto sem a menor sensibilidade, ou como se soubessem de tudo e não sabendo nada.
Os traumas sendo revisitados, medos sombrios vindo à tona, as feridas sangrando e sangrando e sangrando.
Mas eles não estavam se torturando.
Eles estavam se curando.
Para uma ferida sarar, é preciso cuidar dela e não simplesmente fingir que ela não existe e negligenciá-la. E limpar, colocar remédios e curativo não é confortável, dói. É necessário sentir a dor se quiser experimentar a cura. É preciso expor-se para perder a sensibilidade.
Foi isso que Just between lovers trouxe para mim. Revisitar a dor, passear, caminhar por ela e com ela é a forma de conseguir dar adeus e seguir em frente. Deixando aquele fardo que estava desnecessariamente sendo carregado e finalmente sentindo a leveza daqueles que tem novas chances pela frente. Que passaram por dificuldades, mas sobreviveram.
Que nós possamos ter a coragem de MoonSoo e GangDoo de procurar pela graça e brilho de viver mais uma vez, encarar nossas dores e traumas, lutar com eles, ou somente dar aquele abraço que essa versão tão doída e solitária tem precisado. E, então, seguir em frente, de cabeça erguida, prontos para viver mais, mesmo que isso signifique ficar louco novamente.

